Um exercício simples com salário mínimo e aplicações financeiras expõe a erosão da nossa economia: inflação, câmbio fraco e fuga de capitais
Vamos fazer contas de padaria, porque economistas adoram isso. O salário mínimo brasileiro é um bom ponto de partida, afinal, quase 60 milhões de pessoas têm sua renda referenciada a ele. Em 2010, o mínimo era de R$ 510,00; hoje, em 2025, está em R$ 1.518,00. À primeira vista, parece um grande avanço. Mas quando traduzimos para dólares, a realidade muda: em 2010 o mínimo equivalia a cerca de US$ 290 mensais, enquanto agora, 15 anos depois, vale apenas US$ 286. Em outras palavras, ficamos praticamente no mesmo patamar. E ainda ouvimos a velha ironia de que “não comemos dólares” — como se a comparação internacional de poder de compra não fosse importante.
Agora vamos a outro exercício simples. Imagine que em 2010 você tivesse aplicado 1 dólar em renda fixa norte-americana. Hoje, esse valor teria se transformado em aproximadamente US$ 1,40, o que convertido para reais daria cerca de R$ 7,40. Se, em vez disso, você tivesse trocado esse dólar por R$ 1,75, valor da cotação média de 2010, e aplicado na renda fixa brasileira, chegaria a algo em torno de R$ 8,50. Até aqui, parece que o Brasil levou vantagem. No entanto, é preciso considerar a inflação. De 2010 a 2025, o salário mínimo brasileiro triplicou de valor — de R$ 510,00 para R$ 1.518,00 — e o mesmo aconteceu com o custo de vida. Quando deflacionamos o rendimento da aplicação em reais, aqueles R$ 8,50 de hoje equivalem a apenas R$ 3,35 em poder de compra de 2010. Ou seja, o investimento em moeda forte preservou muito mais valor: US$ 1 aplicado lá fora virou o equivalente a R$ 7,40 aqui dentro, contra R$ 3,35 no Brasil.
Esse contraste ajuda a explicar um fenômeno que já mencionei em artigos anteriores: o êxodo de bilionários e grandes fortunas do país. Enquanto a população empobrece ano após ano, corroída pela inflação e pelo câmbio desvalorizado, quem tem capital significativo busca proteção em moedas fortes e ambientes mais estáveis. O resultado é um Brasil com menos poupança interna, menos investimento e mais desigualdade.
Olhando para trás, o quadro é ainda mais preocupante. Em 1990, o Brasil ocupava a 74ª posição no ranking mundial do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Passados 35 anos, estamos na 84ª posição. Pioramos, apesar de sermos um dos países mais ricos em recursos naturais e potencial produtivo. Depois de décadas de trabalho árduo da população, a conclusão é amarga: não avançamos em desenvolvimento humano, e em alguns aspectos até retrocedemos.
Essa é a fotografia que as contas de padaria revelam. Nominalmente, crescemos; na prática, o poder de compra da população estagnou, a renda em dólares não melhorou e o desenvolvimento humano perdeu posições no cenário global. O Brasil parece insistir em se fechar, enquanto o mundo avança. E qual é a solução apresentada pelos governantes? Em vez de encarar a necessidade de reformas estruturais, o caminho escolhido tem sido aumentar ainda mais os gastos públicos e transferir a conta para a sociedade por meio de uma carga tributária já sufocante. É a fórmula que repete o ciclo de ineficiência: mais Estado, menos competitividade e um país que continua andando para trás.