Você já reparou como alguns cliques do nosso dia a dia carregam escolhas maiores do que parecem? Vários músicos têm deixado o Spotify e, desta vez, o motivo ultrapassa o já conhecido incômodo com algoritmos. Em junho de 2025, o CEO Daniel Ek liderou um aporte de €600 milhões na Helsing, empresa europeia que desenvolve tecnologia militar com IA, incluindo drones e sistemas embarcados. Não é rumor ou fake news foi noticiado por veículos como Exame, Financial Times e Reuters
Eu acredito que marca também é comportamento. Quando o principal executivo de uma plataforma cultural faz uma aposta estratégica em defesa com IA, a conversa deixa de ser puramente sobre música. É aqui que muitos artistas traçaram a linha vermelha: King Gizzard & the Lizard Wizard, Deerhoof, Xiu Xiu e Hotline TNT anunciaram a retirada de seus catálogos como boicote, exatamente por entenderem que seu trabalho não deve se misturar ao financiamento de armamento e infraestrutura de guerra, ainda que indiretamente e via investimentos privados do CEO.
E por que isso importaria para quem “só quer dar o play”?
Porque toda plataforma é um ecossistema de valor. De um lado, artistas que há anos reclamam de remuneração insuficiente e mudanças nas regras de pagamento. Do outro, um movimento recente de saída que recoloca ética, direitos humanos e governança no centro da experiência musical. O tema de pagamentos não é novo, e foi alvo de críticas públicas quando a empresa mudou critérios de repasse para faixas de baixo volume de streams a partir de 2024.
Do ponto de vista de gestão de marca, há uma pergunta incômoda (e necessária): o que você financia quando consome?
A Helsing não é uma “big tech genérica”; ela se posiciona como líder europeia de IA para defesa, ampliando escopo de software para “máquinas” (drones, aeronaves, sistemas navais). Isso está documentado nas próprias matérias que detalham a estratégia e o discurso de “AI, massa e autonomia” moldando o “novo campo de batalha”.
Na minha visão, marcas não vivem no vácuo: elas refletem (e afetam) a sociedade. Quando bandas com comunidades fiéis abrem mão de alcance e receita para sustentar um princípio, temos um sinal claro de reputação em xeque, não só para a plataforma, mas para todo o setor de streaming que, ao longo de uma década, normalizou remunerações incompatíveis com a criação artística. O recente efeito dominó entre bandas indie mostra que a decisão de sair já é viável para quem tem base engajada e múltiplos canais de monetização como shows, bandcamp, ou vendas diretas.
E agora José?
Na minha visão, a postura de um CEO não fica mais restrita aos bastidores corporativos, ela reverbera diretamente na percepção da marca e nos negócios. Quando Daniel Ek, à frente do Spotify, decide usar sua holding de investimentos para aportar centenas de milhões de euros em uma empresa que desenvolve drones de guerra com inteligência artificial, o impacto não é apenas financeiro: é simbólico.
Para muitos artistas e ouvintes, essa escolha mistura cultura com armamento, música com conflito, e cria uma associação ética delicada. O resultado? Um movimento de boicote, perda de catálogo e desgaste reputacional que coloca em risco a confiança construída ao longo de anos. Afinal, quando o líder se posiciona, ele arrasta consigo toda a marca, para o bem ou para o mal.
Consumidores e marcas têm caminhos práticos:
No fim das contas, dar o play pode ser um ato cultural e até político. Se você ama música e valores humanos, pense duas vezes sobre onde escuta e o que consome. Esta discussão vai além do algoritmo e toca a ética de quem lidera os ecossistemas que alimentam nosso dia.
Vamos Refletir?
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