Domingos à noite têm mais violência contra a mulher

Domingos à noite têm mais violência contra a mulher

Mulheres entre 25 e 35 anos lideram registros; governo cita políticas públicas como fator para aumento de denúncias.

Uma mulher de 30 anos, auxiliar de limpeza, foi agredida pelo marido no fim da noite de um domingo de maio dentro de casa. Em julho, também em um domingo, outra mulher de 25 anos foi perseguida na parte da noite, em uma via pública, por um homem com quem tinha um envolvimento amoroso. Aos 27, uma cabeleireira sofreu tentativa de homicídio do homem com quem mantinha uma união estável, na madrugada de um domingo de setembro.

Casos de violência contra mulheres acontecem todos os dias. Em média, 357 ocorrências são registradas diariamente em São Paulo em 2024. No entanto, os domingos à noite concentram o maior número de crimes contra mulheres na cidade. Um levantamento na capital paulista analisou 101 mil boletins de ocorrência de violência contra a mulher registrados no último ano.

A imagem mostra a silhueta de uma mulher em pé, em primeiro plano, enquanto uma figura masculina, possivelmente um policial, está em segundo plano, com as mãos levantadas. O fundo apresenta um ambiente urbano com vários carros estacionados, incluindo um carro vermelho coberto com um pano. O céu está claro e azul.

O número de casos pode ser ainda maior, já que mais de um crime pode constar no mesmo boletim de ocorrência. Dentre os registros, 40 mil mencionam violência doméstica. Os dados foram obtidos por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação).

Maíra Recchia, presidente da Comissão das Mulheres Advogadas da OAB-SP, explica que o convívio mais próximo nos finais de semana e o consumo de álcool e drogas são fatores que aumentam as agressões. “São os principais catalisadores das violências”, diz a advogada.

Em 2023, os crimes mais frequentes foram ameaça, injúria e lesão corporal. Apenas 40% dos boletins possuem informações sobre a relação da mulher com o agressor. Desses casos, 81% indicam que o agressor era parceiro ou ex-parceiro e 14% envolvem algum grau de parentesco.

A faixa etária que mais sofre violência é de 25 a 45 anos, com 54.750 registros — mais da metade dos casos com essa informação. Além disso, a maioria dos crimes ocorre em vias públicas (60.488) — mais que o dobro dos registrados em residências (29.789) e na internet (1.522).

Mais de 5.000 ocorrências envolvem menores de idade, e quase 7.000 dizem respeito a mulheres idosas, sendo 411 com mais de 80 anos. Entre os registros, há mulheres de mais de 90 anos vítimas de estupro e bebês de menos de 1 ano que sofreram abuso sexual e lesão corporal.

A demógrafa Jackeline Romio aponta que a violência contra a mulher varia conforme a idade. Meninas até 14 anos são mais vítimas de estupro de vulnerável (39,7%), lesão corporal (20%) e maus-tratos (10%). Já jovens de 15 a 29 anos enfrentam maior risco de violência em vias públicas e por parte de parceiros ou ex-parceiros.

A partir dos 30 anos, a mulher se torna mais vulnerável à violência doméstica praticada por companheiros ou ex-companheiros. Já idosas vivenciam tanto a violência intrafamiliar, semelhante à sofrida por meninas, quanto a persistência da agressão por parte de parceiros e ex-parceiros íntimos, como ocorre com mulheres adultas e jovens.

“Esses padrões reforçam a necessidade de políticas específicas para cada faixa etária, considerando os diferentes contextos de risco”, explica Romio.

Segundo a demógrafa, o caráter interpessoal da violência contra a mulher dificulta sua erradicação, pois está atrelado a relações desiguais de poder. Para ela, a solução exige ações multissetoriais e a transformação das normas sociais. Também é essencial considerar vulnerabilidades associadas à idade, classe social, raça/cor e território, que amplificam a violência contra grupos marginalizados.

O 47º DP (Capão Redondo), na zona sul de São Paulo, registrou o maior número de casos em 2024: 2.415 ocorrências de violência contra a mulher. 

Outras delegacias da capital também apresentam índices elevados, como o 73º DP (Jaçanã), na zona norte, com 2.220 registros, e o 46º DP (Perus), com 2.140.

Embora os registros não indiquem necessariamente onde as mulheres agredidas moram, Romio ressalta que essas áreas também possuem altos índices de outras formas de violência, como letal e econômica. Isso demonstra como a violência de gênero se cruza com outras vulnerabilidades, elevando o risco para mulheres periféricas, especialmente as jovens.

A SSP (Secretaria de Segurança Pública) de São Paulo afirma que a ampliação das políticas públicas voltadas à proteção da mulher tem contribuído para o aumento das denúncias. Em 2024, foram registrados 191 mil casos de violência doméstica no estado, contra 182 mil em 2023.

A pasta também menciona que foram implantadas 162 Salas DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) 24 horas anexas a plantões policiais e Delegacias Seccionais, além de 141 DDMs fixas, com previsão de inauguração de novas unidades — porém, sem detalhes sobre datas e locais.

Entre as medidas de proteção às vítimas, destacam-se a Cabine Lilás, o aplicativo SP Mulher Segura e a ampliação do monitoramento de agressores por tornozeleira eletrônica. Denúncias podem ser feitas em qualquer delegacia, pelo telefone 190 ou pelo canal 180, que funciona de forma anônima e gratuita.

Para Maíra Recchia, da OAB, os dados demonstram uma sociedade ainda profundamente machista. “Se temos leis para tudo, isso não é sinal de sucesso, mas de fracasso. Quando precisamos ensinar a um homem que ele não pode tocar no corpo de uma mulher sem consentimento, significa que falhamos na base”, critica a advogada.

Ela defende que a solução para reduzir a violência contra a mulher passa por mudanças estruturais e culturais. “A sociedade precisa compreender que as mulheres têm direitos. Elas não são objetos de prazer ou posse do gênero masculino”, conclui.

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